domingo, agosto 26, 2007

Poesia em tempo de guerra - Moçambique (III)


UM TERRÍVEL ABANDONO

Ouvi o rumor do vento atravessando
as savanas...
enquanto descia a noite
o silêncio dos companheiros
estremeceu o milho das machambas
regadas com o sangue vermelho
que a morte percorreu na fatídica hora!

Ninguém pode sair daqui p’ra fora!
os corpos esgotados...
abandonados na terra pardacenta
que cavámos para refúgio
das consciências tensas...
ali mesmo sente-se a morte lenta
a sugar o sangue derramado
amargurado sofrimento...

Todos perdem a própria razão
surdos ao rumor do vento!
Reprimimos a violenta respiração
e logo o dedo imprime a força
no gatilho percutor da morte.
Mais um que não teve sorte...

Sente-se uma estranha recusa
entrelaçada no vazio das ideias
que nos consomem em terra lusa!
Quero atirar fora estas peias
urdidas por escabrosos vultos
que nos querem assim matar...
joguetes de interesses ocultos
nem os mortos querem enterrar!

Napota-Nangade, 15 de Março de 1966

(autor desconhecido)

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